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O LEGADO DE LUTZENBERGER

Guilherme Mazui | guilherme.mazui@zerohora.com.br

Há 10 anos a voz do maior ambientalista brasileiro silenciava. Caminho contrário ao dos seus pensamentos.

Intenso, curioso, muitas vezes agressivo e tachado de fanático, José Antonio Lutzenberger antecipou a partir dos anos 70 conceitos disseminados pela sustentabilidade. Apesar da ausência física, que hoje completa uma década, o legado do gaúcho que girou mundo em defesa da natureza se perpetua na atualidade do seu discurso.

- Por que eu sempre nado contra a corrente? Porque só assim se chega às nascentes.

A frase de Lutz escancara seu modo de ser, sensível com a vida e avesso ao senso comum. Progresso contínuo, a qualquer custo? Ele criticou. Lavouras com agrotóxicos? Abominou. Desmatamento na Amazônia? Combateu. Excesso de carros nas ruas? Contrariou. Usinas nucleares? Sempre se opôs.

- É difícil encontrar um tema em que suas ideias não continuem atuais. Ele foi um visionário, tinha uma visão de que a Terra é um sistema integrado, de que o homem deveria aprender com a natureza, e não combatê-la - destaca Lilian Dreyer, autora de Sinfonia Inacabada, biografia do ambientalista.

Porto-alegrense de origem germânica, Lutz nasceu em 17 de dezembro de 1926. Vítima de problemas pulmonares e cardíacos, morreu na manhã de 14 de maio de 2002. Dos seus 75 anos, dedicou mais de 30 ao ativismo ecológico, numa guinada que poucos teriam coragem de empreender.

A figura longilínea com cabelos lisos e desgrenhados, de olhos claros protegidos pelos óculos, tornou-se ícone do ambientalismo no Brasil e no mundo. Mas até 1970, remetia a um executivo da indústria química. Pela Basf, viveu na Alemanha, Venezuela e Marrocos. Quando a empresa passou a produzir agrotóxicos, renunciou à segurança do cargo e aos altos salários. Aos 44 anos, casado com a eurasiana Annemarie, e com as filhas Lilly e Lara pequenas, Lutz voltou a Porto Alegre como ecólogo. Em seguida, aflorou sua veia de ecologista.

Agrônomo pós-graduado em química, via a queda de uma árvore ou o esmigalhar de uma formiga como agressão a seu próprio corpo. Militou por respeito a Gaia, nome dado pelos gregos à deusa da Terra. Assim, em abril de 1971 inspirou a criação da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), entidade que puxou lutas contra podas de árvores, agrotóxicos, desmatamento. Em 1973, forçou o fechamento da Borregaard, indústria de celulose que poluía o Guaíba. Todos feitos embalados pelo magnetismo da fala e da presença de Lutz. Fluente em cinco idiomas (português, inglês, alemão, francês e espanhol), leitor voraz, virou um exímio palestrante - sem medo de embates com executivos, governadores, presidentes ou ministros. A linha de raciocínio, a intensidade, os argumentos conquistaram plateias de qualquer gênero ou renda. De colonos do interior de Montenegro a engravatados em reuniões de cúpula da ONU.

- Meu pai se expressava de forma espontânea, sem preocupar-se com o julgamento alheio ou fixar-se a convenções sociais. Nisso se tornava muitas vezes caricato e assumia uma figura quixotesca na defesa de suas ideias - recorda a filha Lara.

A entrega à natureza rendeu a Lutz, em 1988, o prêmio sueco The Right Livelihood Award, o Nobel Alternativo. De 1990 a 1992, foi secretário do Meio Ambiente do governo Collor e tentou mudar o conceito de administração do país, mas fracassou. Ainda concebeu o Parque da Guarita, em Torres, fez projetos ecológicos, criou uma empresa de consultoria ambiental e a Fundação Gaia. Em Pantano Grande, transformou uma antiga pedreira em seu santuário, o Rincão Gaia. É onde seu corpo repousa na terra, entre árvores, há uma década. Um sepulcro da carne, que simboliza um dos seus preceitos: homem e natureza estão unidos no mesmo sistema.

RIO - 20

O desmatamento na Amazônia desde a ECO 92 está descrito abaixo, os números mostram que apesar de muitas reuniões, muitas diárias, muitas viagens, muitas palavras, perdemos um território igual a diversos países da Europa, um verdadeiro crime contra a humanidade.


1988 - 21.050 Km2
1989 - 17.770
1990 - 13.730
1991 - 11.030
1992 - 13.786
1993 - 14.896
1994 - 14.896
1995 - 29.059
1996 - 18.161
1997 - 13.227
1998 - 17.383
1999 - 17.259
2000 - 18.226
2001 - 18.165
2002 - 21.651
2003 - 25.396
2004 - 27.772
2005 - 19.014
2006 - 14.286
2007 - 11.651
2008 - 12.911
2009 - 7.464
2010 - 7.000
2011 - 6.418
ACUMULADO NO PERÍODO: 392.201 km2
Fonte: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Ministério do Meio Ambiente

PALAVRAS DE MARINA

Brasil retrocedeu para antes da Eco-92, diz Marina

18 de abril de 2012 | 17h 29

BEATRIZ BULLA - Agência Estado
 
A ex-ministra do Meio Ambiente e ex-senadora Marina Silva (sem partido) disse que os brasileiros andaram duas décadas, mas para trás. Ela comparou a postura ambiental do governo brasileiro hoje, às vésperas da realização da Rio+20, com a de antes da Eco-92, primeiro megaevento sobre o tema realizado no Brasil. "O País andou 20 anos para chegar onde estava antes de 1992, quando ainda separava desenvolvimento de meio ambiente", disse Marina, que concorreu nas eleições presidenciais de 2010.
A ex-senadora referiu-se à posição atual do governo brasileiro em relação à Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável que acontecerá em junho no Rio de Janeiro. Marina Silva acredita que é um "retrocesso" separar desenvolvimento de meio ambiente. "Estamos colocando uma pá de cal na memória da Eco-92", afirmou Marina, lembrando que o encontro de 20 anos atrás no Rio consagrou o conceito de desenvolvimento sustentável, que estabelece a ligação entre desenvolvimento econômico, social e equilíbrio ambiental.

Para ela, o País tem de ser protagonista na busca de uma solução para a crise ambiental global. Marina esteve em São Paulo para a divulgação de documento que pede maior dedicação do País para trazer ao centro dos debates o meio ambiente e a transição para uma economia de baixo carbono. O rascunho zero do que deve ser o documento final da Rio +20 foi criticado por focar o desenvolvimento, deixando de lado o meio ambiente.

"Nós tivemos recentemente uma mulher liderando a saída para uma crise econômica, por que não ter aqui no Brasil outra mulher liderando uma saída para a crise ambiental global?", disse, se referindo primeiramente ao papel da chanceler da Alemanha, Angela Merkel, nas negociações frente à crise da União Europeia, e depois à presidente Dilma Rousseff. "Para mim, como mulher, seria motivo de orgulho ver uma mulher liderando um processo de transição para uma agenda de economia sustentável", afirmou Marina, cobrando atuação incisiva de Dilma.

No início de março, Marina criticou a política ambiental de Dilma. A ex-senadora assinou carta aberta, em conjunto com organizações não governamentais, acusando a presidente de contrariar compromissos assumidos na campanha eleitoral sobre, entre outras coisas, artigos do Código Florestal. Marina disse nessa quarta-feira acreditar que "agora a presidente Dilma está respaldada para vetar um Código Florestal que seja contrário à floresta e que promova anistia para desmatadores". E completou: "não há como liderar pelo discurso, nós temos que liderar pelo exemplo".

"O Brasil poderia se unir à posição francesa para a criação de um organismo para o meio ambiente", disse Marina, que, quando esteve à frente do Ministério do Meio Ambiente (entre 2003 e 2008), já havia defendido, junto com o então ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, a criação de um órgão internacional no sistema das Nações Unidas sobre meio ambiente. "Poderia nos dar força, audiência e visibilidade, além de integrar um conjunto de acordos que hoje não conversam", afirmou.

RIO + 20


Brasil mostrará na Rio+20 ganhos ambientais de lei que revogou, diz Marina

O veto da presidente Dilma Rousseff ao Código Florestal foi periférico e insuficente, criticou a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, que considera o texto que agora está sendo analisado pelo Congresso o maior retrocesso já visto na história do país.

Segundo a ex-senadora, cujo mandato terminou em dezembro passado, o Brasil, às vésperas da Rio+20, está passando uma péssima imagem para o mundo e para os próprios brasileiros.
Ela lembrou que o Brasil foi o primeiro país em desenvolvimento a assumir metas de redução de CO2 na reunião de Copenhague, em 2009, e que graças à redução do desmatamento para atingir as metas é que terá bons resultados para apresentar na Rio +20.

"Agora (o Brasil) vai apresentar esses bons resultados em cima de uma lei que eles acabam de revogar", criticou.
Ela destacou como maiores ameaças do novo Código Florestal, que segundo ela se tornou um "código agrário", a manutenção da anistia para os desmatadores e a redução da proteção das áreas que deveriam ser preservadas.
"Não tenho dúvida que depois da Rio +20 será a política da terra arrasada sobre a legislação ambiental brasileira", afirmou.

Marina criticou ainda uma aprovação de uma Medida Provisória ocorrida ontem, no Senado, que dá poderes à presidente Dilma para reduzir unidades de conservação já criadas por outros governos.
"Ela (Dilma) não criou nenhuma unidade de conservação no governo dela e ganhou poder para poder fazer as usinas (hidrelétricas) de Tapajós (PA) e Teles Pires (MT/PA)", lamentou.